FOTO: ROVENA ROSA/ABR

“O Brasil está dando passos sérios e firmes no enfrentamento da corrupção sistêmica e não há nenhuma vergonha neste tipo de ação”, declarou Sérgio Moro durante a sua intervenção nas Conferências do Estoril, que decorrem até quarta-feira, informa a agência Lusa.

“De fato, considerando os casos que já foram julgados, estando ainda outros pendentes, a corrupção descoberta no Brasil é vergonhosa”.

“Nos casos enfrentados no Brasil, as pessoas olham atentamente e se espantam com os níveis de corrupção”, comentou, nesta terça-feira (30), sublinhando que as mesmas pessoas devem ter outra perspetiva desta situação, percebendo os avanços já realizados.

“Não é uma ação somente de juízes e de procuradores, é o anseio da sociedade brasileira para que tenhamos um país mais limpo”, disse Moro.

“Acredito que, apesar de todas estas turbulências, ao final do processo nós teremos um país melhor, uma economia mais forte com uma democracia de melhor qualidade, no qual a corrupção sistêmica passe a ser apenas uma triste memória do passado”, disse.

“Isso não é algo ainda garantido, esse é um trabalho em andamento, mas é possível ter esperança e não digo somente no Brasil, mas quem sabe em toda a região, que é costumeiramente identificada como tendo problemas graves com a corrupção”, enfatizou o juiz.

Moro lembrou que a corrupção sistêmica afeta a economia de qualquer país, porque acaba afugentando os investidores externos e internos.

“Mas, não só isso, muitas vezes este sistema de corrupção impede que agentes envolvidos na economia de um determinado país tomem as melhores decisões do ponto de vista económico para aquele país”, afirmou. “A democracia é fundada na confiança entre governantes e governados. Mas, em contexto de corrupção sistêmica, esta confiança é extremamente abalada”, disse.

“É urgente, prioritário, enfrentar a corrupção em todas as suas formas, mas especialmente esta dita corrupção sistêmica”, com o envolvimento do judiciário, da sociedade civil, do setor privado e dos políticos não envolvidos na corrupção.

“Isso tudo é necessário para combater a corrupção sistêmica, para que passe a ser apenas um comportamento desviante e não uma regra de comportamento”,  defendeu o juiz encarregado dos processos de destacados dirigentes políticos e empresariais, como o ex-presidente Lula, do PT, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, do PMDB, o ex-ministro Antonio Palocci, do PT, ou o patrão do grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht, entre dezenas de outros.

“Um enfrentamento judicial, observando, evidentemente, o devido processo, mas tendo presente que a corrupção sistêmica é tão grave como o crime organizado e aquelas ferramentas que muitas vezes são utilizadas para enfrentar o crime organizado também se fazem necessárias para o enfrentamento da corrupção sistêmica”, disse

Moro estava a referir-se, nomeadamente, ao mecanismo de delação premiada (que dá vantagens ao denunciante, como a redução de pena de prisão, ao delatar os crimes), tendo defendido esta ferramenta, assegurando que não é a única utilizada e precisa de corroboração de provas.

O juiz português Carlos Alexandre disse, na mesma conferência, que a delação premiada não é uma novidade, pois está prevista em várias legislações.

Tanto o juiz espanhol Baltazar Garzón, como o ex-magistrado e político italiano Antonio Di Pietro, mostraram-se favoráveis à utilização da delação premiada em processos de corrupção.

“Não é utilizada (a delação premiada) como uma forma de prêmio. A corrupção é como o matrimônio, em que um dá e outro recebe. Casamento é um ato de amor, a corrupção ato de interesse. Para poder combater a corrupção é preciso romper esse pacto de interesse”, sublinhou di Pietro.