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Gemfields aceita pagar 7,25 milhões de euros por abusos contra direitos humanos em Moçambique

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A mineira britânica Gemfields aceitou pagar uma indemnização de 8,3 milhões de dólares (7,25 milhões de euros) num acordo extrajudicial relativo a 273 queixas de mortes, espancamentos e outras violações de direitos humanos numa mina de rubis no norte de Moçambique. Um general da Frelimo, partido no poder em Moçambique, detém 25% do capital da mina de rubis, segundo informação de boletim editado em Londres.


África 21 Digital com Lusa


O grupo mineiro britânico aceitou ainda criar um painel que determinará a atribuição de compensações financeiras por queixas ou reclamações que venham a ser feitas no futuro, anunciou a empresa, citada pela newsletter Mozambique News Reports&Clippings, editada por Joseph Hanlon, em Londres.

O caso chegou ao Supremo Tribunal de Londres em abril de 2018, por ação da firma de advogados defensores dos Direitos Humanos Leigh Day, que interpôs queixa contra “sérios abusos dos direitos humanos em e em torno da mina da Montepuez Ruby Mining (MRN), pertencente ao grupo Gemfields, com sede em Londres, entre 2011 e 2018, na aldeia de Namucho-Ntoro, Namanhumbir, na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique.

As 273 queixas incluem 18 pessoas alegadamente mortas pela segurança privada da MRN e pela polícia moçambicana, a tiro, espancadas até à morte ou queimadas vivas. Há cerca de 200 queixas de espancamentos, tortura e abusos sexuais, em alguns caos impossibilitando ou limitando permanentemente a capacidade das pessoas regressarem ao trabalho, sublinha o documento.

Há ainda 95 queixas de fogo posto reiterado à aldeia de Namucho-Ntoro, sendo que várias pessoas alegam ter sido espancadas e as respetivas casas queimadas.

O acordo foi estabelecido através de mediação, e portanto, trata-se de um acordo extrajudicial, em que a Gemfields admite “a ocorrência de instâncias de violência”, mas não se assume como “responsável pelos alegados incidentes”. Ainda assim, e de forma significativa, aceita pagar indemnizações por todas as queixas.

Serão pagos 4 milhões de libras esterlinas (4,6 milhões de euros) em reparação de estragos. Cada queixoso terá uma conta bancária aberta, onde será depositado o montante relativo aos estragos sofridos. Serão ainda usadas 500 mil libras (574 mil euros) na criação de um programa de reinstalação na aldeia de Namucho-Ntoro, que está a ser reconstruída para alojar 100 famílias. A Leigh Day cobrou 1,8 milhões de libras (2,07 milhões de euros) em honorários e custas.

A Gemfields aceitou ainda criar um painel para atender a eventuais novas queixas e proceder às respetivas indemnizações e a Leigh Day acordou não aceitar novos casos ou apresentar novas queixas contra a Gemfields ou contra a sua subsidiária MRN no período em apreço (2011-2018).

Ainda que os montantes das indemnizações pareçam avultados, a Gemfields fez saber que os primeiros 11 leilões de rubis extraídos na atividade mineira na localidade em Cabo Delgado garantiram um total de lucros de 463 milhões de dólares (404,56 milhões de euros), pelo que o pagamento à comunidade é inferior a 2% daquela receita, sublinha-se no documento.

A mina tem forte ligações políticas. A MRN é detida em 75% pela Gemsfields, e em 25% pela Mwiriti Limitada, que por sua vez é controlada por Raimundo Pachinuapa, um general veterano da Frelimo, partido no poder em Moçambique.

A região de Cabo Delgado tem vindo a ser palco de violências desde outubro de 2017. Terão já morrido na província mais a norte de Moçambique desde então perto de 150 pessoas, entre residentes, supostos agressores e elementos das forças de segurança.

A onda de violência em Cabo Delgado (2.000 quilómetros a norte de Maputo, no extremo norte de Moçambique, junto à Tanzânia) eclodiu após um ataque armado a postos de polícia de Mocímboa da Praia por um grupo com origem numa mesquita local que pregava a insurgência contra o Estado e cujos hábitos motivavam atritos com os residentes desde há dois anos.

Depois de Mocímboa da Praia, têm ocorrido vários ataques que se suspeita estarem relacionados com o mesmo tipo de grupo, sempre longe do asfalto e fora da zona de implantação de fábricas e outras infraestruturas de empresas petrolíferas que se encontram a iniciar a exploração de gás natural liquefeito.

Um historiador moçambicano recusa-se, no entanto, a ver ‘jihadismo’ nos ataques que se repetem no norte do país, elegendo a miséria como motor do conflito. Na base da violência estão povos revoltados, considerou em entrevista à Lusa em outubro último, Yussuf Adam, docente da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), em Maputo.

Pesquisador em Cabo Delgado desde a década de 1970, Adam pensa que há “uma sublevação camponesa popular, pessoas da região que se sentem exploradas, discriminadas e sem acesso a benefícios sociais e económicos que, na sua opinião, deviam ter”, referiu.


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